terça-feira, 22 de junho de 2010

"Cada um sabe onde seu calo aperta."

Ouvindo: “Freud Flintstone”, Humberto Gessinger Trio (esse cd é uma raridade! Valeu mesmo, Macarrão!).

Salve, pessoal!

Impossível desvincular a sabedoria popular do avanço das ciências e de sua condição atual. O ditado que dá título ao post de hoje é um ótimo exemplo disso!

Da última vez falei sobre uma inquietação minha sobre o exercício da Psicologia em diversas regiões e, por que não dizer, países. Estava pensando sobre como a prática psicológica pode ter variantes (ou variáveis) de acordo com a cultura, o contexto, as tradições de um lugar. Hoje quero aprofundar mais ainda essa análise.

Além da influência de todos esses fatores que citei no parágrafo anterior (e de tantos outros que não falei aqui), existe um fator que conta, talvez, bem mais do que todos esses juntos. Esse fator pode ser resumido, facilmente, na boa e velha frase popular :”Cada um sabe onde seu calo aperta”.

Fernando Rey (sempre ele!) dá um nome mais bonito a isso: subjetividade. A subjetividade e a forma com que ela se manifesta se traduzem na dor que cada um sente com seu próprio calo. Se a região geográfica onde moro, minha família, religião, círculo de amizades, trabalho influenciam ou deixam de influenciar no que penso e sinto, mais importante ainda é a forma com que eu me sinto, penso e me posiciono diante disso tudo. Posso fazer parte de uma sociedade extremamente conservadora e, ainda assim, adotar um posicionamento mais liberal por necessidades ou desejos exclusivamente meus. Para fazer meu calo doer um pouco menos, vou me posicionar da forma que me deixar mais confortável, ainda que precise nadar contra a maré para conseguir isso.

Aliviar meu calo não me exime de outros desconfortos. Pro calo ficar mais folgado, talvez tenha que usar um sapato que não combine com a festa que eu vou. E isso também vai me gerar algum tipo de incômodo. Muitas vezes, inclusive, optamos por manter a dor no calo e nos calçar de acordo com o que a situação pede.

Além de me posicionar de acordo com as variáveis (ou variantes), o que mais tem que nortear meu posicionamento e minha prática psicológica é o meu cliente. Seu calo e a forma com que ele lida com ele. A dor, o alívio da dor, a tolerância da dor e o que ele quer fazer com a dor. Meu cliente, com seu calo, é o foco da minha atuação. Sem perder de vista as coisas que interferem em sua vida, seu pensar e seu sentir. E entendendo que é impossível me livrar das coisas que interferem em minha vida, em meu pensar e em meu sentir, como pessoa e como terapeuta.

Abraços a todos!

P.S: Se o calo do terapeuta atrapalha? Claro! Imagine pisar em terrenos desconhecidos com um sapato nem sempre confortável e com um calo sempre presente. Essa é a vida de quem trabalha com terapia! (Isso daria um bom post...) .

quinta-feira, 17 de junho de 2010

A Psicologia é regional?

Ouvindo: "Além da Máscara", Pouca Vogal.

Salve, pessoal!

Algumas vezes, nessas viagens que faço de vez em quando, já me perguntei: a Psicologia é regional?

Do ponto de vista administrativo, os CRP – Conselhos Regionais de Psicologia, atuam por regiões. Mas isso é a administração, a controladoria da profissão.

Do ponto de vista teórico, temos linhas de pensamentos que vieram dos mais variados lugares do mundo (Skinner era norte-americano, Freud era austríaco, Fernando Rey é cubano, Marcone “Baiano” é de Morro do Chapéu). Mas isso é a teoria, esses amiguinhos sofreram influência dos pensamentos de sua época, seja o pensamento científico, religioso, ético, filosófico...

Mas e a prática, como é que fica? Os princípios administrativos que os Conselhos adotam podem ser vistos com uma ótica mais ampla, nacional ou, talvez quem sabe, mundial. A teoria também tem caráter “Erga Omnis”, vale pra todo mundo (pelo menos, segundo seus criadores). Mas, na prática, é assim mesmo? Aplicar a Psicologia, exercer a Ciência e a Profissão, não seria algo de caráter extremamente regionalista?

Em minha lua de mel, tive a oportunidade de conhecer Gramado, no Rio Grande do Sul. E pude voltar lá novamente, graças a Deus. Logo na primeira viagem, algumas coisas me chamaram muito a atenção. E a pergunta surgia: a Psicologia é regional?

Sempre que posso, tento ligar o rádio nas estações locais. Gosto muito de música e tenho sempre a curiosidade de tentar ouvir o que as pessoas da região ouvem. E as rádios locais sempre trazem boas surpresas musicais.

Liguei o rádio numa estação local, chamada Imperial FM. Na verdade, ela era de Nova Petrópolis, mas pegava em Gramado. Nos intervalos da programação musical, eles sempre anunciavam festas na região. Numa dessas chamadas, um ponto me chamou a atenção: “Casais casados, com certidão do casamento e apresentação da identidade, não pagam”. Achei muito curioso. E muito antes de começar a formular juízos de valores, de pensar se isso era certo ou errado, comecei a pensar isso na minha prática de Psicologia.

Moro em Brasília e as pessoas aqui moram juntas, sem certidão de casamento. Isso tem um significado e um contexto por aqui. Assim como, naquela região, casar e ter certidão de casamento tem um significado próprio também. E como seria isso no meu consultório? O cliente sempre vai trazer uma demanda que envolva esse tipo de contexto regional/cultural. E como fica minha atuação? Como avaliar e, até quem sabe, emitir um posicionamento sobre algo dessa natureza? Será que eu me formei Psicólogo pra atuar em Brasília e precisaria de um curso para atuar em Gramado, em Salvador, em Belém, em São Paulo.. .

A Teoria talvez tenha um caráter universal, mas a aplicação certamente não. A cultura influencia, o contexto influencia e, sobretudo, o sujeito influencia. Sou Baiano, moro em Brasília e posso atender um cidadão gramadense a qualquer tempo. Como transitar nessas nuances, como compreendê-las?

Se a Psicologia é ou não regional eu ainda não sei. Mas que pensar nessas diferenças e tentar agir com um certo relativismo com certeza podem fazer com que ela varie o sotaque de acordo com o local e a demanda e o cliente.

Abraços a todos!

P.S: Ainda não estou atendendo, infelizmente. Vou no CRP-1 providenciar a documentação!

P.S.2: Quando falo em consultório, ainda sem estar atendendo, lembrem que tive um período de estágio que, diga-se de passagem, foi riquíssimo! Não estou na clandestinidade, fiquem tranqüilos!

P.S.3: Estudos de casos são sempre ótimos insumos para a reflexão. Procurem alguns e mandem ver!

P.S.4: Sobre relativismo, sugiro pesquisarem Emile Durkein e seu Relativismo Cultural. Aprendi muito sobre ele com o Prof. Bizerril.